Faz uns 35 anos, mas parece que foi ontem. Éramos cabinhas soltos pelas ruas do Crato. Em sua maioria do Alto da Penha, embora alguns fossem da Caixa D’água, Pinto Madeira, Vila Lobo e São Miguel, contudo, como cabinhas não éramos rivais.
Como estudantes estávamos espalhados pelas escolas Dom Quintino, Estado da Bahia, Alexandre Arraes, Estado da Paraíba e Colégio Estadual Wilson Gonçalves, este era uma espécie de templo onde se reunia a maioria dos cabinhas do Crato, de todas as cercanias, porque lá, havia o científico à noite, e cabinha que é cabinha, começa a trabalhar é cedo, em mercantis, farmácias, lojas de calçados ou material de construção, todos contínuos, os outros, na maior parte, serventes de pedreiros. Havia também uns gatos pingados nos cartórios, e um ou outro engraxate. Ser cabinha é sinônimo do verbo trabalhar.
Mas nós nos divertíamos muito, no futebol de poeira no campo do Barreirão, Areal; ou em qualquer campinho em qualquer terreno à disposição, porque no tempo dos cabinhas sempre havia esses terrenos. Ainda tinha o futsal, que naquele tempo era futebol de salão no Cimentão do Parque ou mesmo na quadra bicentenário. Nos bairros, além do futebol que era todos os meses do ano, todas as semanas do mês, todos os dias da semana, havia o tempo da bila, da pipa, que chamávamos papagaio, do pião, do triângulo, que era no tempo das chuvas quando o chão fica molinho.
Quando cabinha tomávamos banho de rio, no Cafundó, mergulhávamos nos poços da barreira, do Canudo, da banheirinha, e nesses mesmos poços e em tantos outros pescávamos piabas e jandiás e de vez em quando uma traíra, porque o nome já diz tudo. Também havia o rio do Constantino e a safra de oliveiras, que nós chamamos azeitonas, lá também havia as pescarias e os cabinhas de tantos lugares lá também se encontravam.
Ser cabinha era muito bom, bastava curtir as antigas tertúlias e depois numa espécie de fã-clube seguir Bulu Som em suas festas pelas comunidades rurais ou mesmo no Som Treze Mini Clube. Nessas festas ficar com as meninas, sem saber que um dia elas seriam as mães de nossos filhos e as avós de nossos netos.
Ser cabinha é ter jogado no Comercial de Jorjão nos campeonatos da Bicentenário e aquecer fazendo polichinelos e apoio de frente. É ter pulado o muro da bicentenário para ver os clássicos Irmãos Metralhas x Sampaio Pinto, Íbis x Diamante! É ter sido treinado por seu Zé Alves, é saber que Tico da Liga é eterno porque começou no Dafe e se imortalizou na Leac.
Ser cabinha é tudo isso e mais um monte de coisas boas ou não tanto, mas que o tempo apurou as boas e perdoou as que não eram, os que insistiram não chegaram à idade em que estamos. Ser cabinha é hoje eternizar-se nas lembranças das antigas Exposições que barravam a ExpoCrato, simplesmente porque naquela os pães doces com caldo de cana tinham mais sabor, enquanto esta só tem carestia!
Ser cabinha é saber que nos campeonatos da Febemce, Reginaldo Lima era do time do PROMERU, Clayton do Dom Francisco, Cachimbo do Gizélia Pinheiro e Laércio do Dom José, e eram todos rivais, mas depois de adultos viraram grandes amigos. Ser cabinha é ter ido uma vez na adolescência ao Dragão Danças, ou ao Raio Laser e falar hoje em dia como se toda festa estivesse lá. Ser cabinha é ter jogado sinuca no bar de seu Gordinho com medo dos comissários. Ser cabinha é tudo isso e muito mais, que a gente queria dizer, mas que não pode porque a gente não é mais cabinha, a gente agora é adulto.
Por Francinaldo Dias. Professor, cronista, flamenguista, contador de “causos” e poeta
*Este texto é de inteira responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri










