A frase “a família educa, a escola ensina” costuma circular como um lembrete simples, quase óbvio, mas que vem perdendo força em meio a tantas confusões sobre o papel de cada um. Há quem diga que a escola deve ensinar tudo, inclusive valores. Outros acreditam que basta mandar o filho estudar para que ele aprenda a ser uma boa pessoa. No meio desse impasse, professores e pais trocam culpas, enquanto crianças e adolescentes tentam entender quem, afinal, é responsável por ensiná-los a viver.
A família é o primeiro espaço onde se aprende o básico da convivência. É ali que a criança descobre o que é respeito, limites, empatia e responsabilidade. São as pequenas atitudes do dia a dia — pedir desculpas, ajudar nas tarefas de casa, ouvir o outro — que moldam o caráter. Não adianta terceirizar essa parte. Nenhum professor tem como compensar a ausência de uma base familiar que não ensinou o que é certo e errado.
A escola, por outro lado, é o lugar do conhecimento formal, da troca de ideias, da curiosidade e da descoberta do mundo além de casa. É onde se aprende a pensar criticamente, a argumentar, a resolver problemas. A escola amplia horizontes, mas não substitui o que se aprende na vida íntima. Um aluno pode tirar boas notas, mas se não aprendeu a respeitar o outro, dificilmente será um bom cidadão.
Muitos educadores enfrentam a difícil missão de ensinar conteúdos enquanto lidam com comportamentos que deveriam ter sido trabalhados em casa. É comum ouvir relatos de professores que passam mais tempo tentando manter a disciplina do que explicando a matéria. Isso mostra o quanto o “educar” e o “ensinar” se confundiram — e o quanto a sociedade ainda insiste em tratar a escola como um espaço que precisa resolver todos os problemas.
Por outro lado, há famílias que também se sentem perdidas. Muitos pais trabalham longas jornadas e, ao chegarem em casa, mal têm tempo ou energia para acompanhar os filhos. Outros, simplesmente, não sabem como educar — talvez porque também não tiveram esse exemplo. O resultado é uma geração que cresce conectada, mas emocionalmente desorientada, sem referências firmes de comportamento e limites.
A verdade é que nem família nem escola conseguem cumprir suas funções de forma isolada. É uma parceria, e quando uma das partes falha, a outra sofre as consequências. A criança que chega à escola sem noções básicas de respeito atrapalha o aprendizado coletivo. E o aluno que não é estimulado intelectualmente em sala de aula acaba frustrando o esforço da família que o orienta.
Há quem diga que estamos diante de uma crise de valores, e talvez isso seja apenas parte da história. O que existe, de fato, é uma crise de responsabilidade. Cada lado espera que o outro assuma o que não quer ou não pode fazer. Enquanto isso, a educação — no sentido mais amplo — fica à deriva, sem um rumo claro.
Resgatar o equilíbrio entre esses dois papéis é urgente. A família precisa voltar a assumir o compromisso de formar seres humanos com valores, empatia e senso de limite. A escola precisa continuar sendo o espaço do conhecimento, da reflexão e do pensamento crítico. Um não substitui o outro — e quando tentam, o resultado é sempre insuficiente.
No fim das contas, “a família educa, a escola ensina” não é apenas uma frase de efeito. É um aviso. Um lembrete de que a formação de uma pessoa é um trabalho conjunto, e quando um desses lados se ausenta, o outro não consegue sustentar tudo sozinho. A sociedade inteira sente o impacto — e o preço é sempre alto.
Por Mirta Lourenço. Médica, professora, cronista e poetisa
*Este artigo é de inteira responsabilidade da autora, e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri










