Entidades médicas apresentaram à Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) um parecer técnico defendendo a ampliação da mamografia de rastreamento para todas as mulheres entre 40 e 74 anos. O objetivo do documento é influenciar os critérios da agência para certificar planos de saúde em seu novo programa de valorização das boas práticas no tratamento do câncer.
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Atualmente, a recomendação oficial da ANS segue as diretrizes do Ministério da Saúde e do Instituto Nacional do Câncer (Inca), que indicam mamografias a cada dois anos para mulheres entre 50 e 69 anos. No entanto, para as entidades médicas, essa faixa etária exclui uma parte significativa da população que também está sob risco.
A pressão sobre a agência aumentou após a abertura de uma consulta pública sobre o novo programa de certificação, lançada em dezembro de 2023. O modelo proposto recebeu críticas, e a ANS concedeu um prazo de um mês para que as organizações médicas apresentassem evidências científicas a favor da ampliação do rastreamento.
Aumento de casos em mulheres mais jovens
O parecer foi elaborado em conjunto pelo Colégio Brasileiro de Radiologia e Diagnóstico por Imagem, Sociedade Brasileira de Mastologia e Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia. O documento aponta que, em 2024, 22% das mulheres que morreram de câncer de mama no Brasil tinham menos de 50 anos, e 34% tinham mais de 70.
Além disso, os estudos citados indicam que os casos de câncer em mulheres mais jovens têm aumentado e que esses tumores tendem a ser mais agressivos e com maior risco de metástase. Segundo as entidades médicas, a mamografia regular pode reduzir o impacto do câncer, permitindo diagnósticos precoces e tratamentos menos invasivos.
— No grupo do rastreamento, o tumor é detectado no estágio inicial e apresenta características biológicas menos agressivas, permitindo maior número de cirurgias conservadoras da mama. Essas pacientes também têm menos indicação de quimioterapia, reduzindo os efeitos colaterais — destaca o parecer.
As entidades também argumentam que a ampliação da faixa etária pode ser benéfica economicamente, pois o diagnóstico precoce diminui os custos do tratamento ao evitar terapias caras para cânceres mais avançados.
Risco de sobrediagnóstico preocupa o Inca
Apesar da mobilização das sociedades médicas, o Inca defende a manutenção dos critérios atuais. O diretor-geral do instituto, Roberto Gil, afirmou que não há dúvidas sobre a importância do diagnóstico precoce, mas que a ampliação da faixa etária pode não ser eficaz para reduzir a mortalidade.
— Nossa questão não está baseada na incidência da doença abaixo dos 50 anos, mas sim nas fortes evidências de que o rastreamento abaixo dessa idade não tem sensibilidade suficiente, aumentando o risco de sobrediagnóstico e de intervenções desnecessárias, sobrecarregando o sistema de saúde — explicou.
Segundo Gil, mulheres mais jovens possuem maior densidade mamária, o que dificulta a precisão da mamografia e pode levar a resultados falso-positivos. Isso exige exames adicionais, e, em alguns casos, até cirurgias que poderiam ser evitadas.
— Grande parte dos estudos não conseguiu demonstrar aumento da sobrevida em mulheres de 40 a 50 anos, enquanto há comprovação desse benefício na faixa de 50 a 69 anos — afirmou.
Acesso desigual ao exame no Brasil
Mesmo dentro da faixa etária recomendada, a cobertura da mamografia ainda é um desafio no Brasil. A Pesquisa Nacional de Saúde de 2019, realizada pelo IBGE, mostrou que menos de 60% das mulheres entre 50 e 69 anos haviam realizado o exame dentro do prazo recomendado de dois anos.
Para Roberto Gil, incluir mais mulheres no rastreamento poderia dificultar o acesso daquelas que já estão cobertas pelo protocolo:
— Se eu estivesse tentando saltar uma barreira de 2 metros e não conseguisse, minha prioridade seria treinar para superá-la, e não aumentar a altura para 2,50 metros — comparou.
Por outro lado, as entidades médicas temem que, se o protocolo do Inca for mantido, os planos de saúde possam negar exames de rotina para mulheres fora da faixa etária indicada, mesmo que a cobertura seja prevista no rol obrigatório da ANS.
Na rede privada, onde há maior oferta de exames, 53% dos tumores são detectados por mamografia em pacientes assintomáticas, e 40,6% são diagnosticados no estágio I, considerado menos agressivo. O parecer das entidades ressalta que essa realidade não justificaria a exclusão de mulheres abaixo dos 50 anos do rastreamento organizado.
ANS avalia mudanças
A ANS confirmou o recebimento do documento no dia 26 de fevereiro e informou que, neste momento, a proposta do Manual de Certificação de Boas Práticas em Atenção Oncológica está em fase de análise.
A agência destacou que mais de 60 mil contribuições foram enviadas durante a consulta pública e que não há previsão de conclusão para a revisão das diretrizes.
— As análises vão embasar a proposta final de Certificação Oncológica, que será submetida a uma nova audiência pública — informou a ANS em nota.
Por Nágela Cosme










