Há um ano, a Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Mineração (ANM), antigo Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), responsável pela fiscalização, regulação e proteção dos recursos minerais, aprovou mudanças em sua estrutura organizacional, com reflexos diretos no Ceará. O Escritório Regional de Crato, onde se encontra a maior reserva a céu aberto de fósseis do Período Cretáceo, encerrou suas atividades. Além de gerar carência na fiscalização a atividades ilegais, 50 mil peças estão com destino indefinido. A tendência é que o material seja mantido no Estado do Ceará, mas o destino do material, até agora, é incerto.
De acordo com o antigo chefe do Escritório Regional de Crato, Artur Andrade, a preferência é que as peças fiquem sob a guarda da Universidade Regional do Cariri (Urca) e outras instituições que trabalham na área. “Estamos dando preferência ao Cariri”, garante. Entre o material, estão cerca de 30 mil fósseis de uma mesma espécie de peixe, insetos de 20 famílias diferentes, plantas, pterossauros, e aves que evidenciam, pela sua preservação, um padrão de cores. O problema é que tudo isso ainda não está catalogado. Alguns itens sequer estão registrados no livro de tombo.
A divisão do material fossilífero tem levantado debate. O paleontólogo Álamo Feitosa, da Urca, garantiu que a Instituição já enviou ofício pedindo a guarda das peças, mas acusa que elas já estão sendo “loteadas” para outras regiões onde há pesquisa. A equipe do Sistema Verdes Mares entrou em contato com a Agência Nacional de Mineração, mas não obteve resposta até o fechamento da reportagem.
Doações
Artur Andrade reforça que a preferência é que o material fique no Ceará, mas a ANM pode dar preferência a pesquisadores que trabalham com uma subordem específica de insetos, como baratas, grilos, escorpiões, por exemplo. “Isso é uma divisão de caráter técnico, e não de caráter burocrático”, enfatiza. As doações, segundo o servidor da Agência, observarão a estrutura das instituições que solicitarem estes fósseis.
Sobre o tombamento do acervo, Artur garante que, quando chegou em 1995, o livro de tombo era muito genérico. “As apreensões eram feitas, mas parte do material apreendido ficou sub judice. Nós (o escritório) ficamos como fiel depositário, e a Justiça determinava o destino. Este controle de tombamento houve pouco, temos mais controle dos empréstimos. Já o material que está exposto, está tombado”, garante.
O prédio do antigo Escritório Regional do DNPM pertence à Prefeitura de Crato, em convênio firmado desde 1983, ainda como Centro de Pesquisas Paleontológicas da Chapada do Araripe (CPCA). Com o passar dos anos, a estrutura já era insuficiente.
Hoje, no seu depósito, dezenas de fósseis estão pelo chão, alguns expostos ao sol e à chuva. Uma parte, inclusive, apresenta avarias.
Assim que o geólogo Artur Andrade assumiu seu comando, o Escritório Regional possuía apenas quatro técnicos de campo e um do setor administrativo. “Hoje, resumiu-se, praticamente, à minha pessoa”, conta. Sozinho, tinha que dar de conta do acervo, da parte administrativa e também da fiscalização de 10 mil quilômetros quadrados de território no Ceará, Pernambuco e Piauí.
Ausência
Com o fim do escritório, o geólogo foi deslocado para Fortaleza, onde funciona a Gerência Regional. Uma das alternativas para a ANM continuar no Cariri era a criação de uma Unidade Avançada, como aconteceu em Criciúma (SC), Itaiatuba (PA), Governador Valadares, Patos de Minas e Poços de Caldas (MG). Mas a medida não avançou. “Esta ausência da gente pode acelerar a atividade ilícita de compra e venda de fósseis”, ressalta Artur Andrade.
O fim do escritório também preocupa especialistas. Para o paleontólogo Álamo Feitosa, a situação pode abrir um precedente para o tráfico de fósseis. “Eu acho um verdadeiro descaso não ter um ponto de fiscalização direto aqui. Faz mais sentido ter uma Gerência aqui do que em Fortaleza”, pontua o pesquisador.
Com exposição fechada há mais de um ano, o prédio do Escritório Regional do Crato exibia fósseis, principalmente para escolas. Há um mês, Álamo Feitosa foi à Câmara Municipal de Crato pedir que o espaço não seja extinto.
Uma comissão formada por parlamentares, sociedade civil e pesquisadores, analisará a possibilidade de manter no prédio a atividade paleontológica. “A Urca tem corpo técnico para isso. A Universidade tem. Isso não é um problema, é uma solução. O Governo do Estado pode assumir. Ali tem uma coleção com quase 40 anos”, ressalta o paleontólogo.
Já Artur acredita que é possível manter o prédio sem o corpo técnico da ANM. “Podem trazer alunos da Urca ou qualificar alguém. Só a responsabilidade de fiscalização que não muda. Tudo que for passado será feito oficialmente”, pondera o geólogo.
Por Antonio Rodrigues
Fonte: Diário do Nordeste