O doleiro Dario Messer afirmou em mensagens trocadas com sua namorada, Myra Athayde, que pagou propinas mensais ao procurador da República Januário Paludo, integrante da força-tarefa da Lava Jato do Paraná. Os pagamentos estariam ligados a uma suposta proteção ao “doleiro dos doleiros” em investigações a respeito de suas atividades ilegais.
Os diálogos de Messer sobre a propina a Paludo ocorreram em agosto de 2018 e foram obtidos pela PF (Polícia Federal) do Rio de Janeiro durante as investigações que basearam a operação Patrón, última fase da Lava Jato do Rio.
Um relatório a respeito do conteúdo das mensagens foi elaborado pelo órgão em outubro. Nele, a PF diz que o assunto é grave e pede providências sobre o caso.
A Lava Jato do Rio, procurada pelo UOL, informou que já enviou o relatório à PGR (Procuradoria-Geral da República), órgão que deverá definir as providências a serem tomadas. Também consultada pela reportagem, a força-tarefa de Curitiba afirma que Paludo preferiu não se manifestar.
A “propina dos meninos”
Nas conversas obtidas pela PF, Messer fala a Myra sobre o andamento dos processos que responde. Ele diz que uma das testemunhas de acusação contra ele teria uma reunião com Januário Paludo.
Depois, afirma à namorada: “Sendo que esse Paludo é destinatário de pelo menos parte da propina paga pelos meninos todo mês.”
Segundo a PF, os “meninos” citados por Messer são Claudio Fernando Barbosa de Souza, o Tony, e Vinicius Claret Vieira Barreto, o Juca. Ambos trabalharam com Messer em operações de lavagem de dinheiro investigadas pela Lava Jato do Rio. Depois que foram presos, viraram delatores.
Em depoimentos prestados em 2018 à Lava Jato no MPF-RJ (Ministério Público Federal do Rio de Janeiro), Juca e Tony afirmaram ter pago US$ 50 mil (cerca de R$ 200 mil) por mês ao advogado Antonio Figueiredo Basto em troca de proteção a Messer na PF e no Ministério Público. Basto já advogou para o doleiro.
Ao UOL, Basto já negou diversas vezes ter intermediado qualquer pagamento a autoridades em troca da proteção de Messer. “Isso nunca existiu”, disse. “Desafio a qualquer um provar isso. Abro meu sigilo bancário e telefônico, abro o sigilo de minha família. Não provarão pois nunca existiu.”
“Que Enrico [Machado, apontado como sócio de Messer] passou a dizer que o escritório deveria pagar US$ 50 mil por mês para fornecer uma proteção a Dario e as pessoas ligadas ao câmbio”, diz a delação de Tony. “Que essa proteção seria dada pelo advogado Figueiredo Basto e outro advogado que trabalhava com ele, cujo nome não se recorda.”
“Que Enrico, em meados de 2005/2006, começou a exigir dos colaboradores o pagamento de uma taxa mensal de US$ 50 mil, a fim de possuir proteção da Polícia Federal e do Ministério Público”, ratificou a delação de Juca.
Após essas delações, a força-tarefa da Lava Jato do Rio abriu uma investigação sobre o caso. O advogado Antonio Figueiredo Basto foi chamado a depor. Negou a versão de Juca e Tony.
Messer foi chamado a depor no dia 8 de outubro. Ficou em silêncio.
A defesa do doleiro não quis se pronunciar ao UOL sobre a investigação pois ela é sigilosa.
A força-tarefa da Lava Jato do Paraná, da qual Paludo faz parte, declarou que “essas ilações já foram alvo de matérias publicadas na imprensa no passado e, pelo que foi divulgado, os fatos apontam para suposta exploração de prestígio por parte de advogado do investigado [Figueiredo Basto]”.
O procurador é reconhecido por colegas da Lava Jato como referência em investigações baseadas em delações premiadas. Já Figueiredo Basto é um dos advogados que mais fecharam acordos de colaboração com a Lava Jato do Paraná.
Paludo é um dos procuradores mais antigos da Lava Jato
Paludo é um dos procuradores mais antigos da Lava Jato. Integra a força-tarefa de combate à corrupção desde sua criação, no ano de 2014.
Membro do MPF desde 1992, o procurador regional da República Januário Paludo sempre foi tido como uma referência para os membros da Força-Tarefa da Lava Jato, devido o fato de ser o mais experiente entre eles.
Não por outra razão, um dos grupos criados no aplicativo Telegram para que os procuradores trocassem mensagens, cujo conteúdo foi revelado por uma série de reportagens do site The Intercept Brasil, se chamava “Filhos de Januário.”
O primeiro caso de repercussão em que ele atuou foi o do Banestado, investigação sobre lavagem de dinheiro e evasão de divisas movimentou R$ 30 bilhões nos anos 1990 e é considerada um laboratório da Lava Jato.
Paludo compõe o núcleo duro da força-tarefa é e uma espécie de conselheiro do coordenador Deltan Dallagnol. Ele também mantém uma relação de amizade com o ex-juiz federal Sergio Moro, atual ministro da Justiça e da Segurança Pública.
Entre as mensagens de Paludo reveladas pelo The Intercept Brasil chamaram atenção os comentários que ele fez a respeito do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva,
No dia 24 de janeiro de 2017, a mulher de Lula, Marisa Letícia, sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) e foi internada no hospital Sírio Libanês, em São Paulo. “Um amigo de um amigo de uma prima disse que Marisa chegou ao atendimento sem resposta, como vegetal”, disse Deltan Dallagnol, às 22h24. Dez minutos depois, Paludo escreveu: “Estão eliminando testemunhas”.
Dois anos depois, com Lula já na prisão, Paludo afirmou que “o safado só queria viajar”, referindo-se ao pedido da defesa do ex-presidente para que ele saísse do cárcere para acompanhar o enterro do irmão Genival Inácio da Silva, o Vavá.
Força-tarefa da Lava Jato diz que repudia suposições infundadas contra procurador
A força-tarefa da Lava Jato do Paraná se posicionou na madrugada de hoje após a publicação da matéria do UOL. Veja a íntegra do posicionamento:
Em relação à matéria do UOL divulgada nesta madrugada, os procuradores da força-tarefa da Lava Jato informam que:
1. A ação penal que tramitou contra Dario Messer em Curitiba foi de responsabilidade de outro procurador que atua na procuradoria da República no Paraná, o qual trabalhou no caso com completa independência. Nem o procurador Januário Paludo nem a força-tarefa atuaram nesse processo.
2. O doleiro Dario Messer é alvo alvo de investigação na Lava Jato do Rio de Janeiro, razão pela qual não faz sequer sentido a suposição de que um procurador da força-tarefa do Paraná poderia oferecer qualquer tipo de proteção.
3. As ilações mencionadas pela reportagem de supostas propinas pagas a PF e ao MP já foram alvo de matérias publicadas na imprensa no passado e, pelo que foi divulgado, há investigação sobre possível exploração de prestígio por parte de advogado do investigado, fato que acontece quando o nome de uma autoridade é utilizado sem o seu conhecimento.
4. Em todos os acordos de colaboração premiada feitos pela força-tarefa, sem exceção, os colaboradores têm a obrigação de revelar todos os fatos criminosos, sob pena de rescisão do acordo.
5. Os procuradores da força-tarefa reiteram a plena confiança no trabalho do procurador Januário Paludo, pessoa com extenso rol de serviços prestados à sociedade e respeitada no Ministério Público pela seriedade, profissionalismo e experiência.
Fonte: UOL