Roubei pela manhã algumas palavras. Roubo-as o tempo inteiro para escrever forte e de forma singela. Descrever o silêncio, projetar o umbigo, afiar o encanto e multiplicar por dez vez mil a dor, isso é só para não esquecer que dor é dor e dói. Enquanto o berimbau anunciava o gingado, dançava com a curiosidade flutuante cheia de palavras roubadas.
As demandas são intensas. Quase não sobra tempo para desenhar nas nuvens e beber água demoradamente como se estivesse fazendo Tai Chi Chuan. Ainda nos restam palavras para roubar e ser piegas, mandar poesias ao amanhecer, com eu te amo em todas elas, manifestar em cartas públicas um manifesto de rebeldia, escrever nos postes as dores de barrigas e os cotovelos expostos.
Imagino, cada palavra virando bruxaria, sendo porção para cura num caldeirão quente de felicidade e tranquilidade. Vejamos a palavra entranhando no corpo: performance.
Roubo palavras e fico catalogando poemas. É preciso selecionar o que vai ser dito, o lençol que vai cobrir as palavras incendiárias e ensanguentadas. O ventre que expõe um poema sem palavras.
Já não posso esperar até dezembro, o espetáculo acontece todos os dias, as palavras estão sendo trabalhadas. O livro tem mais do mundo do que você e todas as palavras foram roubadas e suas histórias são como os rios, não se passam sob as mesmas águas.
Talvez, as palavras cheguem antes que o sítio seja pintado e os olhos já não as leiam. Atirei mais uma palavra, errei, mas ainda tenho muitas palavras roubadas.
Por Alexandre Lucas. Pedagogo, integrante do Coletivo Camaradas e presidente do Conselho Municipal de Políticas Culturais do Crato/CE
*Este texto é de inteira responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri