Em dezembro de 2018, 89,3% dos executivos de 29 médias e grandes empresas brasileiras se diziam mais otimistas do que no trimestre anterior; hoje, são 41,4%.
Incerteza econômica, políticas governamentais, risco cambial, demanda fraca. Desde o início do governo Bolsonaro, uma série de preocupações – com o cenário interno e externo – derrubou o otimismo de diretores financeiros de 29 médias e grandes empresas brasileiras acompanhadas pela Fundação Getulio Vargas (FGV).
A mais recente edição da pesquisa Panorama Global dos Negócios, feita desde 2012 em parceria com a americana Duke University, mostra que o otimismo dos gestores com a economia do país despencou 28,2%, do nível mais alto desde 2013 – 68,5 pontos, registrado em dezembro de 2018 – para 49,2 no último mês de setembro.
É o mesmo patamar registrado em setembro de 2014. Naquela época, incerteza econômica e políticas governamentais também foram citadas pelos empresários, ao lado de inflação (que vinha na trajetória ascendente que culminaria nos 10,67% registrados nos 12 meses até dezembro de 2015) e do aumento de custo de matérias-primas.
O ponto mais baixo do levantamento foi registrado um pouco antes do início do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff, em setembro de 2015, quando chegou a 35,7. A escala vai de zero a 100.
Em dezembro do ano passado, 89,3% dos executivos que responderam à pesquisa se diziam mais otimistas do que no trimestre anterior, percentual que caiu para 41,4%. Em compensação, a proporção daqueles que se consideram menos otimistas saltou de zero para 41,4% do total de entrevistados.
A pesquisa também tenta captar o sentimento dos diretores financeiros (CFOs, “Chief Financial Officer”, na sigla em inglês) em relação ao próprio negócio.
Nesse sentido, chama a atenção a expectativa de crescimento dos lucros esperados para os próximos 12 meses: a média ponderada caiu pela metade, de 12,9% em dezembro para 6% em setembro de 2019.
A expectativa de investimento em pesquisa e desenvolvimento também encolheu, de 1,4% para 0,4% nos próximos 12 meses, assim como as perspectivas de gastos com tecnologia – de 4,8% em dezembro para 1,8%.
Coordenadora da pesquisa no Brasil, a professora da FGV Claudia Yoshinaga lembra que logo depois do processo eleitoral, no fim do ano passado, o cenário era “muito otimista” por parte dos empresários.
Assim, para ela, os resultados mais recentes refletem certa frustração desta que foi uma base de apoio importante para Bolsonaro durante as eleições com o início do governo.
“A essa altura muitos deles já esperavam que a reforma da Previdência estivesse aprovada”, exemplifica.
Além da dificuldade para implementar a agenda econômica vendida durante a campanha, também não estava no horizonte dos empresários o crescimento do risco político a que o Brasil assistiu nos últimos meses, acrescenta a coordenadora do Centro de Estudos em Finanças da FGV-EAESP.
São episódios como a investigação envolvendo o filho do presidente, Flavio Bolsonaro, as dissidências internas no PSL – com defecção de aliados de Bolsonaro como o deputado federal Alexandre Frota -, ou a dificuldade do governo de organizar uma base de apoio no Congresso, que acabam aumentando o nível de incerteza na economia e, via de regra, têm impacto negativo sobre os investimentos das empresas.
Nos EUA, empresários esperam recessão até 2020
O cenário internacional também teve peso sobre a redução do otimismo dos diretores financeiros, diz a pesquisadora.
“A guerra comercial entre China e Estados Unidos é algo que preocupa o mundo inteiro”, destaca.
De fato, houve redução do otimismo em quase todas as regiões cobertas pela pesquisa – ainda que não da mesma magnitude que no Brasil.
A pesquisa colhe dados de 500 empresas a cada trimestre.
Nos EUA, onde ela é realizada há mais de 20 anos, o índice – chamado de CFO Optimism Index – chegou em setembro ao menor nível em 3 anos. Lá, o indicador está em 63 na escala que vai de zero a 100 – maior do que em todas as outras regiões.
Ainda assim, mais da metade dos entrevistados (53%) acredita que a economia americana entrará em recessão até o terceiro trimestre de 2020, enquanto 67% esperam a recessão até o fim do próximo ano.
“Pela primeira vez em uma década, nenhuma região do mundo parece ter crescimento sólido o suficiente que sirva de motor para a economia global”, comentou John Graham, professor da Fuqua School of Business da Duke University, na divulgação dos dados.
O economista lembrou que os diretores financeiros são tradicionalmente vistos como pessimistas – já que geralmente compete a eles dizer não aos pedidos de liberação de verba de outros departamentos quando é preciso apertar as torneiras da empresa. Os CFOs vinham, entretanto, de uma maré de otimismo nos últimos 6 ou 8 anos.
Um indicativo nesse sentido era o fato de que, até então, a dificuldade para contratar e manter mão de obra qualificada vinha ocupando a primeira posição entre as preocupações dos empresários americanos. Nesta leitura da pesquisa, entretanto, a incerteza econômica ficou no topo da lista.
Fonte: BBC News Brasil