Em 25 de março de 1884, o Ceará aderiu à abolição dos escravos, marcando o dia como Data Magna, completando 138 anos nesta sexta-feira (25), mesma data em que é lembrado o Dia Internacional em Memória das Vítimas da Escravidão e do Tráfico Transatlântico de Pessoas.
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A Organização das Nações Unidas (ONU) publicou em redes sociais que a data é “um momento para conhecer e refletir sobre as histórias do período”.
“Sabemos muitas coisas sobre o comércio transatlântico de africanos escravizados e hoje é um dia que lembramos o crime contra a humanidade: o tráfico humano em massa sem precedentes, as transações econômicas degradantes e as indescritíveis violações dos direitos humanos. Mas também há muitas outras que não sabemos, e hoje é um dia que aprendemos que por trás dos fatos e dos números estão milhões de histórias humanas”, afirmou o secretário-geral da ONU, António Guterres.
Para Guterres, mesmo após abolida, a escravidão segue causando impactos negativos. “Hoje os afrodescendentes continuam a enfrentar discriminação racial, marginalização e exclusão.”
As mensagens são acompanhadas das hashtags, em inglês, “combate o racismo” e “lembre-se da escravidão”.
Abolição no Ceará
A Data Magna do Ceará entrou para o calendário como feriado no dia 6 de dezembro de 2011, após lei publicada no Diário Oficial do Estado (DOE). O projeto foi do então deputado estadual Lula Morais (PCdoB), que apresentou o projeto à Assembleia Legislativa.
Em Redenção, o Museu Senzala Negro Liberto, tenta ressignificar um espaço anteriormente utilizado para opressão de um povo. Dividido entre casa-grande, engenho e senzala, as paredes resgatam a história da escravidão no estado, na cidade pioneira da libertação dos negros.
“Acho um ato muito corajoso da nossa cidade, um ‘interiorzinho’, ter sido a primeira a libertar os escravos”, diz Eneida Muniz, diretora do Museu Senzala Negro Liberto.
O museu começou a funcionar nos moldes atuais em 2003, no Sítio Livramento. Atualmente, a estrutura tanto da senzala quanto da casa-grande continuam preservadas, e os funcionários fazem o trabalho de resgate da história para os visitantes que vão desde estudantes, universitários a turistas do mundo todo.
Contudo, para Eneida, uma parcela importante da população desconhece a história: os próprios residentes de Redenção. “É impressionante como tem pessoas aqui da nossa cidade mesmo que não conhecem a nossa história. O que a gente quer é propagar para não deixar morrer”, declara a diretora.
O museu funciona diariamente, de 8h às 16h. A organização cobra uma taxa de R$ 12 para adulto e R$ 6 para criança. Não precisa de agendamento prévio para conhecer o espaço.
“Nós estamos resgatando a nossa memória, de tudo que nossos antepassados sofreram. A gente explica e volta no passado. É muito triste que, até hoje, ainda vemos reflexo da escravidão, mas infelizmente temos de contar a nossa história”, avalia Eneida.
Problematização da data
É direcionado a esse reflexo negativo da escravidão nos dias atuais que Hilário Ferreira, professor e pesquisador, avalia a Data Magna dentro de um contexto de problematização, apesar de reconhecer a importância da data, inclusive, por conta da participação dos negros — que muitas vezes é apagada da história.
“Por exemplo, houve mesmo abolição? Segundo, como foi a vida dos negros antes e depois da abolição? Eles criaram mecanismos de resistência que ajudaram nos espaços? Como eles foram tratados pós abolição? A busca das respostas por essas questões me levam a problematizar sobre o 25 de março”, explica o professor, que é graduado em Ciências Sociais e Mestre em História Social – ambas pela Universidade Federal do Ceará (UFC).
Ele, que é pesquisador da escravidão no Ceará, relembra sobre um documento feito, à época, pelo chefe de polícia do estado com alguns relatos sobre os episódios ocorridos logo após a abolição.
“Esse relatório é muito elucidador porque ele é um balanço dos fatos que ocorrem pós 25 de março. Primeira coisa, há uma reclamação, os comerciantes, brancos, senhores de escravo, reclamam que os negros não querem mais trabalhar; segundo, eles reclamam que depois da abolição há uma pressão grande para que eles vendam os cativos para determinadas autoridades e sejam indenizados”, detalha o pesquisador.
“O mais gritante é que na abolição, dentro do imaginário dos negros, o Ceará realmente se torna a terra da luz. O problema é que, quando ocorre a dita abolição, negros do Maranhão, de Pernambuco, acham que ao fugir para cá, estão livres. Havia uma ordem de caçar esses negros e devolver aos donos”, complementa o pesquisador da história e da cultura dos negros no Ceará.
Por Samuel Pinusa
Fonte: g1 CE