Por décadas, o temor da diplomacia do Brasil e de militares era de que a floresta fosse alvo de algum tipo de ingerência ou que as políticas para a a região fossem determinadas nos grandes centros de poder, longe de Brasília. Mas é, ironicamente, na pequena cidade de Biarritz que esse medo eterno se traduz num fantasma com tons de ameaça.
Fontes diplomáticas confirmaram ao UOL que, desde a manhã desta sexta-feira, negociadores dos países do G7 estão negociando justamente “medidas concretas” para lidar com a crise na Amazônia. Os detalhes não têm sido revelados por enquanto, mas o pacote poderia envolver um aceno de uma ajuda internacional para combater o fogo, inclusive com recursos financeiros.
A operação foi lançada depois que Emmanuel Macron, presidente da França, apresentou a ideia de trazer o tema ambiental para a cúpula, na quinta-feira. Quando ele tomou a decisão de ir às redes sociais, negociadores revelam que os detalhes já tinham sido costurados com os principais parceiros. Macron não queria, tampouco, se mostrar isolado ao tratar do assunto.
Ao longo de dias, um entendimento havia sido fechado com os demais aliados europeus para que a proposta tivesse a simpatia dos demais. Angela Merkel, Boris Johnson e mesmo Justine Trudeau, no Canadá, embarcaram na ideia da presidência francesa.
Mas a inclusão de um assunto que está em outro território foge da tradição do G7 nos últimos anos. Assuntos que tinham uma relação direta com os países emergentes eram alvos de debates também no G7. Mas se tornou praxe convidar os presidentes dos países em questão para que fossem ouvidos ou pelo menos consultados. Assim fez Jacques Chirac com os Brics, no começo da década passada em Evian. E também esse foi o modelo adotado por Tony Blair, no Reino Unido.
Desde 2008, porém, ganhou ainda mais relevância a agenda do G-20, uma espécie de diretório mundial com 80% da economia do planeta em uma só sala. Mas, desta vez, o sentimento da diplomacia francesa é de que, durante a reunião do G-20 no Japão, o governo de Jair Bolsonaro teria “mentido” sobre seus compromissos ambientais.
A opção, nos bastidores, foi a de usar essa ocasião para dar um recado ao Brasil: ou o país é sincero sobre como pretende lidar com a comunidade internacional ou será excluído do debate.
Os conselheiros dos governos do G7 esperam concluir o pacote de medidas até o começo da manhã deste sábado, ou mesmo antes. A ideia é de que, quando os chefes-de-governo e de estado desembarcarem na cidade costeira, as decisões já estarão tomadas.
Na prática, Macron acredita que reúne quatro dos sete governos do G7 para liderar uma iniciativa sobre o Brasil.
Mas entre os diplomatas brasileiros, a esperança está nas mãos do governo de Donald Trump, aliado de Bolsonaro. Até agora, a Casa Branca não se pronunciou sobre a situação na floresta, o que poderia ser um sinal de que Washington não estaria disposto a fazer parte de uma ofensiva contra Bolsonaro.
Mesmo assim, o temor é de que a blindagem feita por Trump acabe custando favores do Brasil, no curto, médio e longo prazo.
A outra esperança do Brasil era a de contar com o apoio do governo italiano, também visto como um aliado. Mas a dissolução do governo em Roma dificulta saber até mesmo quem seria o representante dos italianos no G7. O Japão também poderia ser um aliado.
Rachados
A outra esperança do governo brasileiro é de que não haja, no fundo, uma posição comum da UE sobre o que fazer com o Brasil. Nesta sexta-feira, França e Irlanda declararam que poderiam ameaçar o acordo comercial com o Mercosul. Mas esses são os dois países que, tradicionalmente, buscaram encontrar motivos para frear um acordo.
Macron, portanto, não escapa de críticas de que estaria usando a Amazônia para justificar barreiras comerciais e agradar seu eleitorado.
Na Comissão Europeia, a visão é justamente a oposta ao que seria defendido pela Irlanda e há uma forte pressão para que o acordo que trará amplos ganhos comerciais para o bloco não seja desfeito. Para Bruxelas, um acordo comercial é o que vai ajudar a manter a pressão sobre Bolsonaro e, assim, o conservar dentro dos tratados como o do Clima.
Entre as ongs, muitas acusam Macron de agir de forma “hipócrita”. Isso por conta da tentativa de Paris de evitar a presença de ambientalistas em Biarritz e de estar usando o Brasil como escudo diante de críticas domésticas por conta de sua política ambiental pouco ambiciosa.
Fonte: Blog do Jamil Chde/UOL