Reunidos em debate virtual organizado por alunos brasileiros de Harvard e MIT na noite deste sábado (17), presidenciáveis concordaram em relação a prioridades para o país e criticaram o presidente Jair Bolsonaro. O evento teve a participação de Ciro Gomes (PDT), Eduardo Leite (PSDB), Fernando Haddad (PT), João Doria (PSDB) e Luciano Huck (sem partido).
As críticas mais ácidas ao presidente foram feitas por Ciro, Haddad e Doria —os três se referiram a Bolsonaro como genocida. Em geral, o encontro teve troca de afagos e mais convergências que divergências, já que todos elencaram temas como educação, tecnologia, emprego e desenvolvimento econômico como prioridades para resgatar o país da crise atual.
A defesa da democracia também foi ponto comum —os presidenciáveis condenaram diversas vezes os ataques de Bolsonaro à imprensa.
Com exceção do petista, os demais nomes já se aproximaram politicamente por meio de um manifesto em defesa da democracia assinado no mês passado. A possibilidade de uma candidatura única veio à tona a partir do texto, assinado também por Luiz Henrique Mandetta (DEM) e João Amoêdo (Novo).
Se considerado o espectro ideológico, esse grupo que assina o manifesto vai da centro-esquerda (Ciro) a eleitores declarados de Bolsonaro no segundo turno de 2018, casos de Doria, Leite e Amoêdo, incluindo ainda um ex-integrante do atual governo (Mandetta), todos hoje na oposição ao governo federal.
Entre os palestrantes, Ciro é o único que já foi lançado como presidenciável pelo seu partido. Leite e Doria podem ter que disputar prévia no PSDB.
Já o PT tem o ex-presidente Lula como prioridade nas urnas em 2022, mas Haddad é o nome que pode substituí-lo caso o petista volte a perder seus direitos políticos em novas condenações até lá —algo considerado improvável.
O tema eleitoral foi abordado no evento. Ciro e Leite destacaram que é preciso entender o que levou Bolsonaro à vitória para superá-lo. ”Nós faremos uma corrente democrática para vencê-lo no voto”, afirmou Doria.
“Temos que dar alguma margem para o diálogo, você não pode se ver como o dono da verdade. Quem tem que arbitrar é o povo nas urnas. O povo erra e corrige no ciclo seguinte”, disse Haddad.
O clima do encontro foi amistoso. Ciro e Haddad, por exemplo, convergiram ao defender o protagonismo do investimento público. O petista também se solidarizou com Doria e Leite em relação aos ataques feitos por Bolsonaro aos governadores.
Doria, por sua vez, afirmou ser testemunha da transição democrática que Haddad fez na prefeitura de São Paulo. Já Huck chamou Haddad de “bom ministro” da Educação.
De maneira geral, Leite, Doria, Ciro e Haddad exaltaram seus feitos e de seus partidos nos cargos públicos que ocuparam, o que deu brecha para crítica de Huck sobre a necessidade de olhar para frente e não para o passado. Haddad e Ciro rebateram a importância de aprender com experiências passadas.
Esse não foi o único momento de sutis trocas de farpas. Ciro salientou que Bolsonaro venceu em São Paulo, numa referência velada ao apoio de Doria ao presidente em 2018. Haddad também afirmou que todos precisam prometer que “não vão votar em psicopata no segundo turno de 2022”, provocação dirigida aos demais.
O cientista político e ex-secretário de Assuntos Estratégicos da Presidência da República Hussein Kalout, que mediou a palestra do tradicional evento Brazil Conference, destacou o que chamou de “denominadores comuns” entre os palestrantes: espírito democrático, respeito ao governo das leis, respeito às instituições, valorização da ciência e da educação e amor ao país. A jornalista Eliane Catanhêde também mediou o encontro.
Ao definir o que é prioridade para o futuro do país, Ciro afirmou que é preciso um projeto nacional de desenvolvimento, com metas e novas instituições, para que o Brasil volte a crescer. Segundo o ex-ministro, o país não cresceu entre 2010 e 2020, período em que foi governado por Dima (PT), Temer (MDB) e Bolsonaro.
Ciro não poupou críticas a Bolsonaro, a quem chamou de “fascista” e “genocida boçal”.
Leite, por sua vez, bateu nas teclas de educação, emprego e meio ambiente como agenda prioritária. Em sua primeira fala, fez crítica apenas indireta a Bolsonaro, ao afirmar que respeita às forças de oposição por haver “uma parcela da população representada” nelas.
De acordo com o governador do Rio Grande do Sul, o país “vai ter que mostrar comprometimento com o equilíbrio fiscal”. Ele defendeu reformas, privatizações e redução da folha de pagamento para melhorar o ambiente de negócios no país.
Falando sobre a influência de Bolsonaro sobre as polícias militares, Leite afirmou que o presidente tem arroubos autoritários. “Mentiras, fake news, desestabilização da relação com a polícia militar são formas de tentar subtrair poderes dos governadores e outras instituições”, disse o tucano.
Doria concordou e disse que Bolsonaro “tem propensão absoluta para ser ditador”.
“O delírio do Bolsonaro é formar uma milícia para resistir de forma armada à derrota eleitoral que se aproxima”, completou Ciro.
Haddad, ex-prefeito de São Paulo e ex-ministro da Educação, exaltou as gestões petistas e o governo Lula com bastante ênfase, além de criticar Bolsonaro. “Não deveríamos esperar 2023 para enfrentar, no Congresso Nacional, um governo que representa o governo do desmonte”, disse.
O petista disse ainda que o presidente tem as universidades como inimigas e apontou que há um retrocesso institucional em curso, com aparelhamento por Bolsonaro da Polícia Federal, do Ministério Público e do Poder Judiciário.
Governador de São Paulo, Doria elencou a vacina como prioridade para o país. O assunto é confortável para ele, que foi o responsável por viabilizar a vacinação no Brasil e pressionar o governo Bolsonaro nesse sentido.
“O governo Bolsonaro errou gravemente ao não fazer a compra de várias vacinas desde agosto do ano passado. Negou a vacina, negou a pandemia e o direito à vida de milhares de brasileiros”, disse o tucano.
Doria também apontou que Bolsonaro desrespeita o meio ambiente, os direitos humanos, o jornalismo e a democracia.
O último a falar na primeira rodada, Huck foi o que fez uma fala mais provocativa aos demais. O apresentador de TV, cotado para ser candidato em 2022, ressaltou que não é político e que não é movido a projeto pessoal, mas quer contribuir na construção de um projeto futuro. Disse representar a sociedade civil e conhecer a realidade do país.
Huck ressaltou que os políticos terão que fazer concessões e se unir para tirar o Brasil da crise.
“Vamos ter que fazer concessões, iluminar o que nos conecta e não o que nos afasta. […] Vamos ter que deixar de lado nossas vaidades e exercitar nossas humildades”, disse. Huck completou ainda que os políticos não devem discutir “os centímetros a mais” que um ou outro governo fez nos últimos anos.
O apresentador também criticou a política ambiental de Bolsonaro, afirmando que ele “passou a boiada”, embora não tenha sido contundente como os demais nas falas contra o presidente.
Fonte: Folhapress