A literatura parece não se esconder, fica nas brechas do que não foi dito, no banco vazio e na fila bancária. Nos dois dedos de salto e de café. No cheiro de alecrim e de suor. No mendigo na parada do ônibus que já não sabe o seu destino e perdeu a conta da sua idade escondida nas barbas e no encardido do tempo.
A literatura se embola com o cotidiano, ela é parida da vida, tendo como família o tempo, os espaços e as pessoas. A literatura nunca é uma filha do acaso.
Se a literatura provém da vida, o inverso é profundamente mentiroso. É sobre verdades que se escreve usando muitas mentiras, só para disfarçar a realidade das intenções. Até mesmo porque ser livre pode significar grandes prisões.
Chuva de palavras é uma bagagem cheia de nós, assim como a literatura é molhada dos nossos enigmas e olhares.
Uma canção nunca é concreta diante do rosto curioso que busca respostas num primeiro encontro, as palavras não são suficientes, é preciso amaciar o barro, colocar doce na dureza e hora e outra roubar a moleza para ir descobrindo a literatura que brota em dias de chuva e de máscaras, num tempo que pode ser sem tanta pressa para que dê tempo para abrir uma conta de cumplicidade.
Por Alexandre Lucas. Pedagogo, integrante do Coletivo Camaradas e presidente do Conselho Municipal de Políticas Culturais do Crato/CE
*Este texto é de inteira responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri