Um estudo brasileiro publicado no periódico Journal of the American College of Nutrition analisou a relação entre a canela e o diabetes tipo 2. Os resultados, promissores, apontam que consumo diário da especiaria pode auxiliar no controle da doença.
O diabetes tipo 2 é o mais comum, e geralmente acomete pessoas com mais de 40 anos de idade. Nele, nosso organismo se torna incapaz de usar adequadamente a insulina, um hormônio produzido no pâncreas que tem um papel importante no metabolismo do açúcar. Quando isso acontece, não conseguimos usar esse combustível, e a glicemia (concentração de glicose no sangue) aumenta – causando uma série de consequências negativas para o corpo.
A associação entre canela e controle do diabetes não é novidade. Mas segundo José Claudio Lira, pesquisador da Universidade Federal do Ceará e autor principal do estudo, os resultados, até então, não eram claros e exigiam maiores investigações. “Foi por isso que, em 2016, dei início à pesquisa durante o meu doutorado”, contou Lira à Super.
O ensaio clínico aconteceu entre agosto e dezembro de 2019, e contou com 140 voluntários de Parnaíba, município do Piauí. Todos eles tinham diabetes tipo 2 e frequentavam cinco unidades básicas de saúde da cidade.
Havia pessoas de ambos os sexos, com idade entre 18 e 80 anos. Todos apresentavam índice de hemoglobina glicada (que mede a porcentagem de glicose no sangue) igual ou acima de 6%. A título de comparação, quem possui menos que 5,7% apresenta baixo risco de diabetes.
Os voluntários foram divididos em dois grupos. O primeiro ingeriu, durante três meses, três gramas diários de canela em quatro cápsulas – o equivalente a uma colher de chá do alimento. “A dosagem foi escolhida a partir de uma média dos estudos similares que já haviam testado canela ao redor do mundo”, explica Lira. Ao segundo grupo, foi dado placebo.
Todas as pessoas seguiram com a mesma rotina de alimentação, exercícios e medicamentos de antes. O estudo era triplo cego: pacientes, técnicos de laboratórios, a responsável pela análise dos dados e o pesquisador principal não sabiam que grupo estava utilizando canela ou placebo. É uma forma de evitar possíveis resultados enviesados. “Havia um único cientista envolvido no estudo responsável por essa classificação”, disse Lira. “As informações ficaram em um envelope lacrado, que foi aberto no final do ensaio.”
Ao final de 90 dias, os voluntários realizaram novos exames de sangue para medir as diferenças. O grupo que ingeriu canela teve redução média de 0,21% nos índices de hemoglobina glicada, enquanto os que receberam placebo registraram aumento médio de 0,38%.
Já no teste de glicemia em jejum, também usado no controle do diabetes (e feito, claro, em jejum), houve uma redução de 10 mg/dL dentre os que tomaram canela, enquanto no grupo placebo o nível aumentou 21 mg/dL. Os voluntários tinham, em média, um nível de glicemia em jejum de 186 mg/dL – o ideal é que ele fique sempre entre 100-120 mg/dL.
Foi calculado também o índice HOMA-IR, que mede se a resistência à insulina está alta ou não. Em média, o índice diminuiu 0,47% entre os que usaram canela e subiu 0,30% no grupo placebo.
“Além disso, pacientes entre 40 e 65 anos tiveram resultados melhores que os outros, assim como aqueles que possuíam diabetes há mais de cinco anos”, aponta Lira.
A pesquisa contou também com profissionais de outras instituições, como a USP, a Fundação Oswaldo Cruz e a Universidade de Washington, nos EUA. No futuro, há planos de refazer o teste com um número maior de voluntários, bem como em mais lugares do Brasil. “Cada região possui hábitos alimentares e de vida distintos, que acabam interferindo no quadro de saúde do paciente com diabetes.”
Vale ressaltar que a canela deve funcionar como um complemento ao tratamento, que inclui medicamentos adequados, uma dieta saudável e a prática regular de exercícios. “O diabetes é uma doença crônica, que deve ser tratada pelo resto da vida. Só que, com o tempo, as pessoas podem relaxar ou até mesmo ignorar os cuidados necessários”, ressalta Lira. Foi por esse motivo que a pesquisa tentou desenvolver uma nova aliada a esse tratamento, que não causasse efeitos colaterais e fosse de fácil adesão. “A dose de canela pode acontecer em uma única refeição ou em doses fracionadas, e o ideal é que ela seja consumida in natura.”
A canela não é a única que pode ajudar com o diabetes. O pesquisador cita também testes promissores com alimentos como maracujá, gengibre e cúrcuma. “Queremos disponibilizar possibilidades para que o paciente possa melhorar a qualidade de vida e minimizar gastos com hospitalizações e complicações geradas pela doença.” As substâncias com o melhor desempenho podem, ainda, servir como base para a formulação de medicamentos fitoterápicos.
Fonte: Superinteressante