O ministro da Economia, Paulo Guedes, atrelou a volta do auxílio emergencial aos mais vulneráveis, ao fim do que chamou de “aumento automático” para educação, segurança e reajuste de salários de funcionários públicos.
Nesta terça-feira, ao lado do presidente Jair Bolsonaro, Guedes argumentou que gastos fixos e indexados no Orçamento impedem esse tipo de ação social.
O ministro ainda criticou quem pede o impeachment de Bolsonaro por sua atuação em relação à pandemia. Para ele, o movimento é uma “sabotagem” à democracia brasileira.
Enquanto isso, o presidente Jair Bolsonaro nega a possibilidade de volta do auxílio por causa do alto endividamento do país. No dia 25 de janeiro, ele disse a um apoiador: “A palavra é emergencial. O que é emergencial? Não é duradouro, não é vitalício, não é aposentadoria.”
Usando uma metáfora de guerra, ele pediu adesão dos políticos à responsabilidade fiscal e afirmou que o país não pode gastar demais e deixar a conta para ser paga por futuras gerações.
Guedes quis tranquilizar os que pedem algum tipo de auxílio diante do recrudescimento da pandemia. Ele afirmou que, “caso o pior aconteça”, o governo sabe o que fazer.
— Não pode ficar gritando guerra toda hora. Nós temos que ter muito cuidado. Quer criar o auxílio emergencial de novo, tem que ter muito cuidado, pensa bastante. Porque se fizer isso não pode ter aumento automático de verbas para educação, para segurança pública, porque a prioridade passou a ser absoluta (para o auxílio) — disse Guedes, durante evento virtual com investidores internacionais.
Bolsonaro: compromisso com teto de gastos
No mesmo evento, Bolsonaro também defendeu a manutenção do teto de gastos e voltou a indicar que não prorrogará o auxílio emergencial.
Na véspera, o presidente havia dito que o benefício não era “duradouro”, nem “vitalício” e que não deveria ser visto como aposentadoria.
Em 2020, para fazer frente aos gastos com a pandemia, o Congresso aprovou o Estado de Calamidade Pública e o Orçamento de Guerra, que permitiram conceder o auxílio emergencial de R$ 600 e depois prorrogá-lo por R$ 300 até dezembro.
Essas medidas se encerraram em dezembro, já que em janeiro as regras fiscais voltaram a valer. O problema é que a pandemia teve um recrudescimento, com novas restrições a atividades econômicas.
Guedes criticou gastos fixos do Orçamento que inviabilizam a concessao de benefícios sociais como o auxílio emergencial.
— Pega os episódios de guerra aí e vê se teve aumento de salário durante a guerra, vê se teve dinheiro para saúde, educação. Não tem. Aqui é a mesma coisa. Se apertar o botão ali, vai ter que travar o resto todo — afirmou Guedes.
Presidente do BC reforça defesa de contenção fiscal
Mais tarde, o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto, disse que novos gastos sem contrapartidas não terão um efeito de estímulo para a economia porque aumentam o risco fiscal.
— Quando eu faço um estímulo fiscal, no final das contas eu quero condições estimulativas na economia, quero mais dinheiro circulando. Por um lado eu tenho o efeito do dinheiro circulando na economia, só que se do outro lado eu tiver um efeito na parte de prêmio de risco que seja um efeito contrário em magnitude maior, eu posso fazer até um gasto fiscal e ter um efeito contracionista na economia.
Campos Neto defendeu que, para tomar uma decisão, é necessário saber quais programas são extraordinários, quais são permanentes e quais são os custos envolvidos, fiscais e políticos:
— Se a gente for nos debates anteriores, toda medida fiscal anterior era meritória, foi um gasto que foi bom, um programa que parecia bom. O problema é que programas de curto prazo, acabam virando de longo e acabam virando permanentes.
Equipe econômica costura plano B
Apesar de ainda resistir a conceder um novo auxílio emergencial, a equipe econômica tem discutido internamente um modelo para o programa caso as pressões pelo benefício persistam ou a pandemia piore ainda mais.
Um cenário que está sendo estudado é focalizar o benefício entre os mais vulneráveis no grupo de informais, numa forma de reduzir o escopo do programa, que atendeu quase 60 milhões no ano passado.
A equipe também discute um valor menor, podendo ser fixado em R$ 200. Mas uma parte dos técnicos vê a possibilidade de que o repasse suba para R$ 300, de acordo com as negociações com o Congresso.
Mesmo com a criação desses cenários, o Ministério da Economia não quer prorrogar o auxílio. A avaliação é que o benefício não é necessário porque os técnicos consideram que a economia está se recuperando e logo o grupo de mais afetados pela Covid-19 será vacinado.
Orçamento de Guerra impede aumento de servidores, diz Guedes
O ministro afirmou que, “se a pandemia se agravar”, o governo saberá agir. O país registrou 631 mortes pela Covid-19 nesta segunda-feira, chegando ao total de 217.712 óbitos desde o começo da pandemia. Com isso, a média móvel de mortes no Brasil nos últimos 7 dias foi de 1.055, a maior desde 4 de agosto (quando foi de 1.066 mortes).
— Se a pandemia se agrava, continuam 1.500 mortes por dia, a vacina não chega, nós falhamos miseravelmente na entrega das vacinas… Vamos observar. Caso o pior aconteça, nós temos o protocolo da crise — disse Guedes.
Guedes cobrou responsabilidade antes de decretação do Orçamento de Guerra em 2021 e lembrou que, em 2020, o salário dos servidores públicos foi congelado por dois anos como compensação pelos gastos com a pandemia.
— É preciso ter muita responsabilidade quando você, entre aspas, declara a guerra. Se você disser que a pandemia está realmente assolando o Brasil de novo, você vai declarar o estado de guerra. Estado de guerra significa o seguinte: não tem aumento de salário durante dois anos de funcionalismo, os pisos estão todos bloqueados, acabou esse negócio do piso subir automaticamente — afirmou.
Mais gastos, só com ‘sacrifícios’
Para o ministro, é preciso “sacrifícios” para repetir os gastos do ano passado, que chegaram próximo a R$ 600 bilhões.
O ministro reforçou que o governo está empenhado em garantir a vacinação para toda a população, e que “com a vacinação em massa ocorrendo, o país volta à normalidade”.
Isso significa, segundo Guedes, a retomada das discussões sobre as reformas no Congresso, incluindo a reforma administrativa, que propõe uma série de mudanças no funcionalismo.
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— Reformas são fundamentais para recuperarmos a nossa dinâmica de crescimento, que foi perdida ao longo de décadas — afirmou Guedes.
Cortes em despesas fixas
Essa não é a primeira vez que o ministro ou integrantes de sua equipe sugerem cortar gastos para ampliar a despesa com programas sociais.
No ano passado, durante as negociações para a criação do chamado Renda Brasil, o secretário especial da Fazenda, Waldery Rodrigues, concedeu entrevistas nas quais defendeu congelar aposentadorias para criar o benefício sem desrespeitar regras fiscais.
A ideia, no entanto, foi vetada por Bolsonaro, que ameaçou dar um “cartão vermelho” ao autor da ideia.
Waldery permaneceu no cargo, e Guedes continuou a defender a chamada desindexação de despesas — ou seja, a suspensão da obrigação constitucional de reajustar de acordo com a inflação determinados gastos, como o salário mínimo e benefícios previdenciários.
As declarações de Guedes sobre o auxílio ocorrem a menos de uma semana das eleições para as presidências da Câmara e do Senado. Nos últimos dias, candidatos apoiados pelo governo na disputa defenderam a prorrogação do auxílio emergencial.
Ministro cobra responsabilidade fiscal de políticos
— A classe política tem que se unir à responsabilidade pelos orçamentos. Se ela apertar o botão vermelho, de emergência, não é só pegar o dinheiro e sair correndo. Tem que fazer todo o protocolo de sacrifícios por anos. Se você está em guerra, não tem distribuição de medalhas. Ou seja, não pode ter aumento de salário enquanto não passar um, dois anos depois da guerra.
Guedes afirmou que o custo do combate à pandemia não pode ser transferido para as próximas gerações:
— Tem que pagar pelo custo da guerra, não pode empurrar isso para as futuras gerações. É muito fácil gastar 8%, 10% do PIB num ano, pedir para gastar de novo no ano seguinte e empurrar o custo para os nossos filhos e netos. Tem que ser responsável.
Fonte: O Globo