O ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta alerta para o risco de que a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) seja utilizada pelo governo para frear a aprovação da vacina da Sinovac (vacina de produção chinesa em parceria com o Instituto Butantan, de São Paulo) e, assim, garantir que o produto da Oxford em acordo com o governo federal chegue primeiro ao mercado.
Em entrevista à coluna, o ex-chefe da pasta criticou o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) por rejeitar um acordo com o estado de São Paulo para a compra da vacina da Sinovac um dia depois de o ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, acenar para a colaboração com os chineses.
Eis os principais trechos da entrevista:
UOL – Como o sr. avalia a decisão do presidente Bolsonaro de desautorizar seu ministro da Saúde sobre a compra da vacina da Sinovac?
Luiz Henrique Mandetta – Lamentável. Ele (Bolsonaro) permanece no mesmo erro. Apenas olha para si e opta pela politização. Podemos ter críticas sobre João Doria (PSDB). Mas ele conduziu a resposta à pandemia com responsabilidade. A questão é ter o foco no vírus e na ciência, que é o que vai nos tirar dessa. Ele [o presidente] está perdido e míope.
O atual ministro Eduardo Pazuello perde força diante da decisão de Bolsonaro de o desautorizar?
Ele nunca teve força. Ele não pode perder o que não tem. Não tem conhecimento técnico e está la para cumprir ordens, mesmo absurdas. Ninguém do mundo científico presta atenção nele.
E como fica a relação com a China depois dessa situação?
Imagino que o presidente (Bolsonaro) tenha levado um puxão de orelha dos EUA por conta da decisão do Ministério da Saúde. O que existe hoje é uma disputa intensa entre chineses e americanos.
Quais podem ser os próximos passos dessa história entre as vacinas no Brasil?
Todos os olhos estarão voltados agora para a Anvisa, que é liderada por um almirante (Antonio Barra Torres). A questão é a de saber se a agência vai sentar sobre o dossiê de aprovação da vacina chinesa, pedir novas informações e, assim, permitir que a vacina da Oxford seja a primeira a ser autorizada. A próxima guerra será a Anvisa, e um teste para ver se será uma agência técnica ou política.
Um dos pontos ainda do governo federal é a questão de a vacina não ser obrigatória…
Esse não deveria ser o debate. O que precisamos falar é sobre dar escala e como garantir a produção maior. No caso de São Paulo, a produção prevê um abastecimento de 20 milhões de pessoas, num estado com o dobro da população. Como é que estamos falando em obrigatoriedade nesse contexto?
Além disso, pelos contatos que estou tendo no exterior, eu imagino que logo governos estrangeiros vão exigir certificado de vacinação para quem for viajar.
Por Jamil Chade
Fonte: UOL