Na tentativa de iniciar a votação da reforma da Previdência nesta terça-feira (9), o governo federal aprovou medidas para afagar a bancada ruralista e impulsionou o envio de recursos às bases eleitorais de deputados.
O Executivo acelerou a liberação de emendas orçamentárias e ofereceu um lote extra aos congressistas. Já foram prometidos ao menos R$ 5,6 bilhões a deputados.
Ainda assim, os partidos ampliaram a lista de exigências, atrasando o início da votação da reforma no plenário.
Com isso, a análise do texto, que é a prioridade legislativa do presidente Jair Bolsonaro, só começou às 20h48 desta terça. Enquanto negociações eram feitas, deputados discutiam, no lugar, a regulamentação da vaquejada.
O plenário encerrou à 0h43 da madrugada desta quarta a fase de debates da reforma. A expectativa dos parlamentares é que às 10h30 haja quórum para a retomada dos trabalhos no plenário da Câmara.
Embora tenha adotado na campanha o discurso de que colocaria fim ao toma lá dá cá na relação com o Congresso, o governo ofereceu a cada parlamentar fiel um lote extra de R$ 20 milhões de emendas (em um total de mais de R$ 3 bilhões), que é o direcionamento de verbas do Orçamento para o reduto eleitoral dos políticos.
Além disso, acelerou o empenho —o registro oficial de que pretende executar aquele gasto— das emendas ordinárias, conforme mostrou a coluna Painel nesta terça.
O governo liberou quase R$ 1 bilhão na véspera da votação —um total de R$ 2,6 bilhões nos seus primeiros dias úteis de julho, segundo levantamento do gabinete do líder da oposição, Alessandro Molon (PSB-RJ).
Presente no plenário da Câmara, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, afirmou ao site Jota que a liberação de verbas de sua pasta foi um esforço para a aprovação da reforma.
A declaração difere da do presidente da República, que em entrevista e nas redes sociais disse que a medida é uma ação normal da administração pública, sem relacioná-la à Previdência.
À Folha, Mandetta disse que a liberação de emendas é uma ação normal, embora seja óbvio, em suas palavras, que ela tenha sido impulsionada pela aproximação da votação da reforma.
O governo precisa do apoio de no mínimo 60% dos deputados (308 dos 513 votos).
Partidos pressionam por um volume maior de empenho de emendas e também manifestam desconfiança de que o governo, passada a votação, vá descumprir a sua palavra e não executar de fato as emendas.
“Toda a relação do Legislativo com o Executivo é sempre de desconfiança, até porque esse governo, no início, gerou uma desconfiança na relação. Mas acho que isso vai caminhar para o leito normal do rio”, afirmou presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), ao falar sobre as emendas.
O deputado se tornou o principal fiador da reforma. Entre outros pontos, ele discutia com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), compromisso de ele segurar a votação da reforma no Senado até que o governo cumpra a promessa de liberar, de fato, o dinheiro das emendas ordinárias e extras.
O ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni (DEM), chegou à Câmara por volta das 18h e, segundo deputados, assegurou que o governo irá cumprir a sua palavra.
A oposição acusou o governo de tentar comprar votos e de praticar crime de responsabilidade ao liberar dinheiro para emendas em valores bem superiores ao autorizado pelo Congresso.
“O governo está comprando votos com cheque sem fundo. Esse governo usa fake [news] até para comprar votos dos seus aliados”, afirmou o líder do PT, Paulo Pimenta (RS).
Entre os pontos do texto em que o governo cedeu estão regras mais vantajosas nos cálculos de aposentadoria para mulheres —uma demanda da bancada feminina— e de pensão por morte.
Isso pode reduzir a economia com a reforma de cerca de R$ 980 bilhões para algo próximo de R$ 960 bilhões em dez anos, mas as contas ainda estão sendo finalizadas —a proposta original do governo falava em economia de R$ 1,2 trilhão.
Num afago à bancada do Nordeste, o governo publicou nesta terça um decreto que regulamenta o refinanciamento de dívidas de produtores rurais com a concessão de descontos.
O programa beneficia produtores das áreas de abrangência da Sudene (Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste) e Sudam (Superintendência do Desenvolvimento da Amazônia).
De acordo com o coordenador da bancada do Nordeste, deputado Júlio César (PSD-PI), o decreto é um pedido dos congressistas das duas regiões e pode criar clima mais favorável para a votação da reforma.
Fonte: Folha.com