Com a autorização da Defesa Civil, famílias estão, aos poucos, retornando para casa, nas proximidades da barragem de Jati, no interior do Ceará. O rompimento de uma tubulação da obra ocorreu na tarde de sexta-feira (21), mas ainda se vive no presente o temor das comunidades. “Voltamos pra casa porque é o jeito, vai ser uma noite acordada. Quem é que dorme?”, afirmou a dona de casa Maria Francisca, uma das moradoras da região.
As famílias retiradas de casa devido ao vazamento de água na barragem foram autorizadas a retornar ao local na quarta-feira (26), após inspeções de engenheiros e técnicos do Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR). Conforme o engenheiro e coordenador de obras e fiscalização do órgão, Tiago Portela, 200 agentes atuam na obra para torná-la “ainda mais segura”.
A moradora Maria Francisca retornou ainda na quarta-feira para sua residência na Vila dos Ipês, uma agrovila que compõe a comunidade mais próxima da barragem. A dona de casa, no entanto, não sabe até quando fica. “Já procurei casa pra alugar, mas não encontrei. É muito difícil sair correndo com a família, com a roupa do corpo, e voltar depois achando que tá tudo bem. Ficou o trauma em mim e nos meus filhos”.
Apesar da garantia dada pelo Ministério do Desenvolvimento Regional de que a barragem está segura – uma vez que a ocorrência se deu com um agente externo, que não afetou a parede principal do reservatório – o desespero com que todos saíram, em meio aos gritos, alarme da sirene e o ronco da tromba d’água do rompimento ainda estão na cabeça da família de seis pessoas.
O G1 acompanhou a volta da família para casa, já trazendo a mobília que havia sido retirada no dia seguinte à fuga. Filho de Maria Francisca, Eduardo, de oito anos, ajuda o pai a trazer os pertences para dentro da residência, mas depois chora no quarto. “É o susto disso tudo”, explica a mãe. Um dos motivos de voltarem para casa, além da própria autorização da Defesa Civil, é que estava muito complicado ficar na casa da irmã, duas famílias ocupando o espaço que já parecia pequeno para uma.
Retorno autorizado
Parte das famílias afetadas pelo rompimento na barragem deixaram os abrigos onde estavam alojadas e também voltaram para casa na quarta-feira. Duas mil pessoas precisaram deixas as residências após o vazamento no duto. Não há registro de feridos.
O incidente na barragem de Jati aconteceu no dia 21 de agosto, quando parte da tubulação que recebe água do açude rompeu e começou a escavar estrutura pedregosa próxima à parede. A obra onde ocorreu o vazamento faz parte do Eixo Norte da transposição do Rio São Francisco, que foi inaugurado no dia 26 de junho pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
De acordo com o MDR, as inspeções após o início das obras atestaram a segurança da infraestrutura, que não oferece riscos à população. Pouco mais de 72 horas após o rompimento de um duto na barragem, mais de 50% das obras de recomposição foram concluídas e os trabalhos seguem em regime 24 horas.
“O Ministério do Desenvolvimento Regional e as empresas contratadas tomaram, desde o início, todas as providências para garantir a segurança e preservar as vidas das pessoas que vivem no entorno da barragem. Demos toda a assistência aos moradores após a evacuação e determinamos que fosse feito, de imediato, um trabalho de recomposição da estrutura”, disse o ministro Rogério Marinho.
Além dos trabalhos de recomposição do talude da barragem, o MDR apura a causa do rompimento da tubulação.
O ministério solicitou que relatórios técnicos sejam apresentados sobre cada etapa de funcionamento desde a última quinta-feira (20), quando foram abertas as comportas para passagem de água até a Barragem Atalho, primeiro dos seis reservatórios no trajeto até a Paraíba. Empresas responsáveis pela execução, testes e comissionamento da barragem tem até sexta-feira (28) para entregar as informações.
A partir do material produzido e de reuniões com as companhias envolvidas no projeto, execução e operação da Barragem Jati, será possível avaliar as possíveis causas do rompimento. O Ministério também está iniciando um processo para contratação de uma consultoria independente, que deverá ser definido também até esta sexta-feira (28).
Sobre as causas, o representante do Ministério do Desenvolvimento Regional, engenheiro Tiago Portela, afirmou que não foi encontrado nenhum indício de ação criminosa, mas insiste na cautela: “é prematuro falar.
A gente sabe que o rompimento foi uma onda de pressão muito grande, agora o que provocou esse “golpe”. Vamos tentar uma empresa mais isenta possível, para não vir com vícios, e a gente saber exatamente o que ocorreu. Sabendo as causas (do rompimento), vamos buscar responsabilização e reparo dos danos à administração. Ela não pode ficar no prejuízo”, disse.
Vazão de água dez vezes maior
O rompimento da tubulação gerou uma tromba d’água com uma vazão até dez vezes superior ao liberado pela válvula. O estrago provocado na estrutura próxima à parede da barragem provocou enxurrada de lama e pedras que arrastou postes, gerador de energia, cabos de alta tensão, casa de vigilância, casa de válvula e até uma camionete de uma das empresas de engenharia contratadas. Funcionários conseguiram fugir em três carros.
Recursos para assistência às famílias
Na terça-feira (25), foi autorizado o repasse de R$ 100,6 mil para assistência a famílias que foram evacuadas.
A medida foi realizada por procedimento sumário – quando a ocorrência, pública e notória, é considerada de grande intensidade. Nestes casos, para agilizar o atendimento à população, a Defesa Civil Nacional antecipa os trâmites e publica a decisão antes mesmo que as solicitações do município ou do estado sejam oficializadas.
Fonte: G1 CE