Válido desde o dia 20 de março deste ano, o decreto do Governo do Estado – que incentiva o distanciamento social e impede a abertura de negócios não-essenciais – tem, conforme uma pesquisa detalhada, realmente reduzido a circulação de pessoas e favorecido o isolamento dos cearenses em suas residências.
Estudo realizado pela empresa de tecnologia InLoco, tendo como base dados de geolocalização de telefones celulares em todo o Brasil, mostra que, no dia 7 de abril, o índice de isolamento no Ceará atingiu 52,9%. Significa que, dos aparelhos cujos dados foram utilizados no Estado, mais da metade se manteve em casa durante o dia. Segundo a empresa, a precisão é 30 vezes maior que o GPS Global.
Em Fortaleza, o número foi um pouco abaixo do que o cearense (51,8%, no dia 6 de abril), mas ainda assim, manteve taxa frequente, sempre acima da metade. Os maiores números da Capital e do Estado se concentram nos fins de semana; nos dias 21 e 22 de março, primeiro após o decreto do governador Camilo Santana, o índice de isolamento chegou a 71%. No entanto, esse índice vem caindo por dois fins de semana consecutivos.
Em âmbito nacional, a taxa de isolamento cearense é a quarta maior das unidades da federação, levando em conta ainda o dia 7 de abril. O Estado fica atrás de Distrito Federal (56,4%), Goiás (56,3%) e Pernambuco (53%). O índice brasileiro foi de 49,6%.
Conforme o diretor executivo da InLoco, André Ferraz, a ferramenta “é entregue às autoridades para que elas consigam fazer ações de conscientização mais direcionadas”, contudo os dados não são lidos de forma individual. “A gente está tratando de bairros, de regiões, é essa a única informação que os governos estão tendo acesso”, garante. A plataforma trabalha com localização de 60 milhões de telefones no Brasil.
De acordo com a plataforma digital IntegraSUS, montada pela Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa), até às 17h10 de ontem (9), o Estado já contabilizava 1.445 casos confirmados da Covid-19 e 57 óbitos em decorrência dessa infecção viral. Fortaleza concentra a maioria dos registros: 1.283 confirmações e 45 mortes.
Contudo, o Ministério da Saúde informou ontem que a região de saúde de Fortaleza – que engloba, além da Capital, os municípios de Aquiraz, Itaitinga e Eusébio – tem a maior taxa de incidência do Brasil, apresentando 43,9 casos a cada 100 mil habitantes. Em seguida, aparecem as regiões de saúde de São Paulo (40,4/100 mil habitantes) e Manaus, Entorno e Alto Rio Negro (28,1/100 mil habitantes).
Os números, porém, poderiam ser muito maiores se o isolamento social não tivesse sido efetivado desde meados de março. É o que aponta um estudo da Universidade Federal do Ceará (UFC), em parceria com a Sesa e a Célula de Vigilância Epidemiológica de Fortaleza.
Curva
O levantamento relaciona a data de solicitação do exame de teste positivo para Covid-19 e o total de casos informados pela Secretaria da Saúde. Conforme a pesquisa, caso o Estado não tivesse feito nenhuma ação, poderia ter-se chegado a 1.349 casos em 25 de março, ou seja, há cerca de quinze dias. De acordo com o professor José Soares de Andrade, do Departamento de Física da UFC, o modelo da pesquisa trabalha com três tipos de indivíduo: o infectado, o que ainda não foi infectado e o que foi removido (curado ou falecido).
“Esse modelo, no início de uma infecção como essa, tem o comportamento exponencial. A gente faz o que a gente chama de extrapolar, para mostrar o comportamento dela, caso alguma interferência não tivesse sido feita”, explica o professor José Soares.
Segundo o gerente da Célula de Vigilância Epidemiológica da Capital, Antônio Lima, as medidas de isolamento interromperam essa tendência natural da curva. “O isolamento funcionou muito bem. Mas eu não posso afirmar que ele funcionou bem para todas as áreas. É necessária a manutenção para a gente controlar a curva”, afirma.
Antônio Lima ressalta que as ações de distanciamento funcionaram nos bairros-epicentro da Capital, como os da Regional II, mas garante que agora é o momento de “reforçar essa ideia para bairros ainda não afetados e também têm diferenciais relacionados, evidentemente, à necessidade de se movimentar”.
Conforme o chefe da Vigilância Epidemiológica de Fortaleza, o estudo indica que é preciso aumentar os níveis de isolamento, sem necessariamente endurecer o decreto, mas por meio da orientação. Governo e Prefeitura, segundo ele, vêm fazendo fiscalizações em portas de bancos e feiras livres, por exemplo, a fim de diminuir as aglomerações nas áreas de grande tráfego.
“Em todos os bairros, (o tráfego de pessoas) reduziu, mas a redução varia de 80% a 40%. A gente tem que aumentar e fazer que todo mundo que está com 40% se aproxime de 80%”, aponta ele, como uma das ações necessárias para conter o avanço do novo coronavírus em Fortaleza.
Apelo
O governador do Ceará, Camilo Santana, em live realizada no fim da tarde de ontem (9), utilizou o estudo realizado pela UFC para reiterar o pedido de isolamento social. “A gente precisa desse tempo para preparar o sistema de saúde, os leitos, as UTIs, que é o que tem sido feito pela Secretaria da Saúde do Estado, pelos municípios. Com essa velocidade (mais lenta), a gente consegue ir atendendo a demanda da população que precisa dos casos mais graves”, disse.
“Eu tenho visto muita gente na rua, achando que não é sério, que não vai acontecer com ele. E eu faço um alerta importante: ficar em casa é proteger a sua família e também as outras pessoas”, ressaltou o governador.
Por Cadu Freitas e Messias Borges
Fonte: Diário do Nordeste