Quando descobrimos que três questões do Enem 2025 foram anuladas por suspeitas de vazamento, não era apenas uma falha no exame — era uma ferida aberta na confiança do sistema educacional. Não basta tratar isso como um simples acidente técnico. Estamos diante de um alerta grave: a lisura do principal exame nacional para acesso ao ensino superior está manchada.
O INEP, ao anular os itens, falou em “precaução” e reafirmou que protocolos de segurança foram seguidos. Mas essa justificativa soa como esfregar álcool em ferida profunda: não soluciona o problema, apenas disfarça a dor. Quando alguém antecipou essas questões em uma live, o risco não era teórico — era real, palpável, e afetava milhões de estudantes.
A reação dos alunos é de revolta e descrença. Para muitos, anular apenas três questões é um tapa de luva de pelica em um rosto inchado. Como pode isso resolver algo tão sério? Como garantir que outros itens não foram comprometidos? Se já vazou parte, até onde vai esse buraco de segurança?
Entre os denunciados, há um universitário do Ceará que afirmou ter memorizado as perguntas de pré-testes. Isso é incompetência? Fraude? Ou uma estratégia de longo prazo para esquecer que educação deveria ser mérito, e não aposta de sorte em vazamentos? Não dá para fingir que foi tudo acidental.
Aliados do sistema educacional, daqueles que ainda acreditam que estudar duro vale alguma coisa, estão assistindo a esse circo sem pipoca. Gastam horas com revisão, apostilas, simulados — e esse escândalo ameaça transformar cada segundo de esforço em pó. A sensação de injustiça não é abstrata: é concreta e cruel.
A convocação da Polícia Federal para investigar o caso é inevitável, mas já deveria ter acontecido antes — antes que a moral do Enem se transformasse em piada de internet. Não basta punir os envolvidos. É preciso reconstruir a segurança do exame do zero, porque a credibilidade foi abalada de um jeito difícil de reparar.
Estudantes temem que esse episódio não fique só nas três questões anuladas. Há quem já peça a anulação total da prova. E, sinceramente? Diante da magnitude da traição, qualquer outra resposta seria frágil: meio copo não apaga o incêndio, e retomar a normalidade sem mudar nada é conviver com a instabilidade.
A educação não pode se permitir esse desperdício. Não é só sobre notas ou acesso à universidade: é sobre a ideia de que o esforço tem valor real. Se permitirmos que vazamentos minem a credibilidade do Enem, estaremos dizendo que ganhar vantagem por meio de trapaça é mais possível do que estudar de verdade — e é isso que assusta mais.
Por Mirta Lourenço. Médica, professora, cronista e poetisa
*Este artigo é de inteira responsabilidade da autora, e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri










