Outro dia, reparei que até meu café esfriava antes de eu conseguir tomar o primeiro gole. Estava lá, fumegando na xícara, enquanto eu respondia e-mails, conferia notificações e resolvia listas imaginárias de tarefas que ainda nem haviam surgido. Percebi, naquele instante aparentemente banal, o quanto andamos vivendo no modo automático — acelerados, ansiosos e quase sempre ausentes de nós mesmos.
A pressa tem sido vendida como virtude. Quem corre, acumula, entrega e responde tudo em tempo recorde é aplaudido. Mas, no meio disso tudo, esquecemos de perguntar: o que estamos ganhando com tanta urgência? Porque, se for bem honesto, o que mais vejo por aí são pessoas cansadas, exaustas de si mesmas, com o corpo presente e a alma em algum lugar do passado ou do futuro.
Bem-estar não é uma fórmula mágica, tampouco um plano de academia com validade mensal. É um gesto, um olhar interno, um compromisso silencioso com o agora. Não há pílula que cure o excesso de velocidade da vida, mas há escolhas que aliviam o peso da bagagem: desligar o celular ao anoitecer, comer devagar, ouvir mais do que responder, caminhar sem destino por alguns minutos do dia.
A presença é subversiva nesse tempo em que tudo exige urgência. Sentar-se à mesa e saborear uma refeição sem distrações virou ato de resistência. Ouvir o que o corpo sussurra — uma dor leve, um cansaço que insiste, uma tristeza sem nome — é reconectar com algo essencial que, na correria, aprendemos a ignorar.
Lembro de uma vizinha que, toda manhã, regava as plantas do quintal como quem conversa com amigas de longa data. Ela dizia que aquilo a curava de dentro pra fora. “Não é sobre flor, é sobre tempo”, me disse certa vez. Anos depois, entendi. A vida precisa de pausas para florescer. Precisa de espaços entre os compromissos, de domingos sem culpa e de noites em que se dorme sem checar a agenda do dia seguinte.
É claro que nem sempre dá para escapar do ritmo que nos empurra. O trabalho cobra, os boletos existem, as crianças pedem atenção. Mas mesmo nesse cotidiano apertado, cabe um respiro. Um momento só seu, em que você se olha, se escuta e se cuida — ainda que por cinco minutos. É nesse tempo que mora o bem-estar que tanto buscamos.
Menos pressa não significa menos ação, e sim mais intenção. Significa fazer o que precisa ser feito com presença, e não com atropelo. Significa que cuidar de si não é egoísmo, é prevenção. Porque quem se ignora por muito tempo, uma hora se perde de si.
No fim das contas, talvez a receita para o bem-estar seja simples: um pouco de silêncio, uma pitada de rotina leve, boas doses de afeto e o compromisso diário de estar, de fato, onde o corpo está. O resto, a vida cozinha com o tempo.
Por Mirta Lourenço. Médica, professora, cronista e poetisa
*Este artigo é de inteira responsabilidade da autora, e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri