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Natais – Por J. Flávio Vieira

Colunista escreve semanalmente no Revista Cariri

26 de dezembro de 2021
Natais – Por J. Flávio Vieira

Do alto do Morro Suvaco do Urubu, entre casas espremidas umas contra as outras, Susej, observava o mundo, estrategicamente, da janelinha do barracão. Erigida a casinha com papelões e plásticos pelo pai, um coletor de materiais recicláveis. Susej era o apelido carinhoso do menino Suetônio Ulisses Severiano Júnior, nascido com nome nobre e pomposo mas que ali fora deixado por uma cegonha que, certamente, estava com o GPS defeituoso. Desde pichototinho, o guri percebeu, do seu observatório, as incongruências do mundo. O morro, até a sua metade, era coberto por mansões gigantescas, em feitio de palácios e castelos, e habitadas por bacanas, com carrões vistosos, heliportos e piscinas olímpicas. Quase não tinham filhos. Só se os viam, nos finais de semana, em que faziam festas suntuosas, reunindo outros ricos que dividiam bebidas esquisitas, comidas do mesmo teor e outros aditivos que eram aspirados em bandejas de prata. A parte superior do morro era tomada por casebres mal enjambrados, alguns de madeira, outros de papelão e outros tantos de taipa. Cada um deles acomodava várias gerações de viventes: pais, avós, filhos muitos, genros, noras.

Cedinho, os adultos saiam em busca da sobrevivência, lutando pelo almoço e pela janta, com vendas em sinais de trânsito, em pastoreio e lavagem de carros, em trabalhos domésticos e subempregos informais. A trupe de filhos ia para a Escolinha de manhã e, na volta, ficava solta pelo Morro, soltando pipa, brincando de esconde-esconde, jogando bola. O Estado ali só aparecia em tempos de eleição ou com a chibata e o cassetete. Susej morava na encosta do Morro e, desde cedo, se deparou com a realidade dura e crua: metade do Morro esbanja, a outra metade passa fome. Aquilo, inclusive, já se tornara parte de uma estranha normalidade, como se o prato lhes fosse entregue pronto e feito, a mistura era aquela mesma, não se tinham que discutir a receita, o gosto, nem o tempero.

Susej foi crescendo e, aos poucos, descobriu que havia alguma coisa de errado naquela cozinha. Conversou com o padre da capelinha do Morro, que vinha mensalmente celebrar a missa, e ele tentou lhe convencer que era assim mesmo: esse mundo já tinha dono, mas no outro, o celestial, tudo subverteria e quem foi mão, neste planeta, lá seria palmatória. Mas foi o professor da Escolinha que abriu seus olhos. Para ele, a história da humanidade vinha sendo escrita, desde o início dos tempos, pelos mesmos privilegiados: eles tinham destinado o paraíso para uma pequena casta de escolhidos e o inferno para os outros.

Susej começou a se reunir com os amigos, uns doze rapazotes da sua proximidade e convenceu-os que o jogo precisaria ser mudado. Mas, como? Combinou para pesquisarem o que os ricaços consumiam mais e, aí, eles poderiam vender para eles, já que moravam tão próximo: apenas algumas escarpas de morro os separava. Os meninos, depois de alguns dias, retornaram com a informação. Havia, sim, alimentos chiques como frutos do mar, caviar, mas o que mais usavam era um pó branco, parecido com bicarbonato e que dava um barato muito caro. Susej, então, junto com a récua de doze amigos, resolveram entrar no negócio. Souberam de um colombiano, que morava numa outra favela próxima, e conversaram com ele, combinando detalhes. Antes, no entanto, Susej e toda sua corriola, fizeram um juramento: jamais se envolveriam pessoalmente no uso, uma vez que empresa de urso tomando de conta de mel, está fadada naturalmente à falência. A quebra do juramento, de comum acordo, seria motivo para a eliminação física sumária.

A partir desse dia, a empresa do Suvaco do Urubu prosperou. Vendiam toneladas de pó para os ricaços do morro e, rápido, espalharam, numa espécie de holding, para favelas vizinhas que tinham o mesmo tipo de Dináfrica (na encosta, Dinamarca e no topo, África). Começaram um trabalho social no Suvaco, ajudando pessoas necessitadas com alimentos, material de construção, remédios, compra de livros para seus filhos. Não demorou muito e a polícia começou a subir mais morro acima. Falava em combate ao tráfico e aos traficantes, mas, em geral, vinham para o achaque, para o suborno, para dividir “o bolão”. Susej compreendeu que, em nenhum momento, os policiais procuravam os consumidores estribados. Atacavam os aviões e esqueciam os aeroportos.

Um dia, Isca, um dos doze do Morro, descobriu-se tinha se viciado e estava transtornado, cheirando como louco e sem repassar o apurado. Os demais se reuniram e, por unanimidade, julgaram-no, sapecando-lhe uma pena menos radical: a expulsão. Isca, adicto, endoidou. Procurou a polícia e virou traíra. Entregou todo o jogo, a troco de algumas gramas de coca. Com a delação, Susej foi preso e julgado. No transporte para a prisão estadual, os policiais resolveram suborná-lo. Queriam dinheiro muito, a troco de sua liberdade. Susej aguentou firme e negou-se a entregar o resto da organização. Foi fuzilado a queima roupa, sob a justificativa legal que tentara fugir.

No Morro os rapazes se organizaram e continuam tocando a empresa, tendo como sócios policiais e, como fiéis consumidores, os ricões do momento. Susej agonizou sem imaginar que estava reescrevendo uma mesma história natalina que se repete, com diferentes nuances, há mais de dois mil anos.

Por J. Flávio Vieira, médico e escritor. Membro do Instituto Cultural do Cariri (ICC)

*Este texto é de inteira responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri

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