Mediado pelo saudoso senhor Pedro Saraiva de Macedo, que mais tarde viria a se tornar presidente de honra do VEC, foi doado o terreno para a construção do campo de futebol que acabou sendo nomeado com o nome do benfeitor, em gratidão ao esforço e empenho para a consecução do terreno. Seu Pedro, como era conhecido entre todos que compunham o VEC, sempre manteve uma relação muito próxima com a equipe, sobrepondo inclusive à questão política na qual seu Pedro Saraiva fazia carreira. A sua amizade com o VEC perdurou até o fim de sua vida.
A inauguração do Campo Pedro Saraiva, o Mosqueirão, como ficou conhecido foi realizada no ano de 1978, a partir de então, não apenas o VEC mas também todos os clubes do Alto da Penha passaram a ter um local para treinos e jogos. Desde a fundação o campo foi palco para diversas competições e partidas memoráveis e representou um marco na história futebolística da comunidade, que passou a ter em casa a oportunidade de ver os grandes nomes da época apresentarem seu futebol, atletas como Esmeraldo, Pedim de Telina, Nego Dino, Judinan, Luizinho, Menoca, Luiz Biraia, Dola, Vicente de Manezim, mais tarde, Doda, Cabra, Marcos Cara de Boi, só para exemplificar. Isso teve como resultado o surgimento do conceito de ídolo no futebol amador ganhando força na comunidade.
Para a juventude alto da penhense, a oportunidade de ver os craques da comunidade treinando e jogando naquele campo significava o sonho de um dia ser jogador do Vasco Cratense. Para pelo menos duas gerações de jovens da comunidade, jogar no Vasco Esporte Clube se tornou uma meta a ser alcançada, e esse objetivo iniciava, nas quartas e sextas feiras à tardinha, indo ver os treinos do time, buscando a bola tantas vezes chutada no grotão, gandulas por conta própria.
Depois, os mais “taludinhos” com certa habilidade eram chamados a completar o time da laranja que treinava contra o time principal. A próxima etapa na busca da ascensão ao time principal era jogar durante alguns anos no segundo quadro, esfriando o sol, como se dizia na época.
Seguindo estas etapas é que se formaram as gerações dos anos 90 e metade dos anos 2000, jogadores como Doda, Hernando, Marcos cara de boi, Nen, Clayton, Zé Carlos, Cabra, Cruel, Eugênio, geração dos anos 90, e Mauricio, Difá, Sérgio, Buzu, Pedro Tripa, Rogério Leonel, Marquinhos da Mancha, Ismênio, Sérgio Domingos, e tantos outros atletas nos fins dos anos 90 e início dos anos 2000.
Não obstante a alcunha do Campo Pedro Saraiva ter-se tornado muito conhecida “O Mosqueirão”, a origem dela não orgulhava a comunidade. Na época, o aterro sanitário da cidade do Crato era numa área depois do Alto da Penha, porém muito próxima à comunidade, o que acabava por atrair muita mosca ao local e espalhar-se pela comunidade. Durante anos uma luta foi travada pela comunidade para a retirada do aterro daquele local, o que acabou por ser concretizar em 1991 na gestão do presidente da comunidade Tico de Júlia, que na época era também treinador do time principal do VEC.
Se é verdade que o esporte liberta a juventude afastando-a das drogas e da violência, essa ideia se comprovou com outro fato importante sediado no campo Pedro Saraiva. Em 1991, após anos de planejamento, Francisco Sousa Brito, Francisco Maguim, ao lado da diretoria do VEC e dos atletas do time principal, que vivia o início de uma das eras mais vitoriosas do clube, conseguiram implantar a “Escolinha de Futebol Pedro Elton”, o ex atleta juvenil que deu nome à escolinha era irmão dos atletas Deda e Dunga, e ainda jovem sucumbira a uma doença. A escolinha Pedro Elton reuniu mais de 100 crianças e adolescentes da comunidade e acabou por se tornar uma importante ferramenta em prol da inclusão no esporte como forma de combate à criminalidade juvenil e às drogas.
Vários atletas, muitos ainda em atividade nos dias atuais, iniciaram nesta escolinha e posteriormente passaram a atuar nas equipes da comunidade e adjacências. VEC, Ceará, Coração da Grota, Real de Inácio, São Paulo, Beira Rio foram as principais equipes de destino destes jovens.
Durante o período em que funcionou, 1991 a 1995, passado e presente se aproximaram para a projeção do futuro. Isso foi possível quando se permitiu que atletas veteranos do tempo da fundação palestrassem aos garotos que tinha entre 8 e 14 anos, além disso, possibilitando que alguns atletas do time principal se tornassem treinadores das equipes da escolinha, tornando assim possível uma interação de sucesso que culminou com um resultado que embora não haja registros oficiais, foi de extrema importância para a comunidade, seja porque ampliou o número de atletas do bairro para as equipes locais, seja porque havia uma exigência de que as crianças estivessem matriculadas nas escolas e apresentassem bons rendimentos, ou ainda porque nos fins de semana a gurizada voltava-se para o futebol, afastando-se das ofertas mundanas de violências e drogas.
O campo Pedro Saraiva foi palco de competições importantes como o Campeonato do Alto da Penha na década de 90, copa da Amizade, anos 90 e 2000, jogos importantes do campeonato da cidade de 1991, inclusive a final memorável do segundo turno do certame municipal de 1991. Na ocasião a equipe vascaína se sagrara campeã do Crato ao superar o Juventus por 4 tentos a zero. Gols marcados por Doda, Tarcísio, Marcos cara de boi e o pequeno Dó. A final virara um passeio! O fato mais importante desta final no campo do Mosqueirão se deu nos dias que antecederam a partida final. O Vasco conquistara o direito de decidir em seus domínios por ter apresentado uma campanha impecável durante a competição, fora campeão do primeiro turno e uma vitória significava o título arrastão.
O adversário era nada mais, nada menos que a equipe do Juventus, formada por grandes nomes do futebol cratense, atletas como Deca e Binha Saraiva figuravam naquele time. A diretoria do Juventus exigiu, condicio sine quae non, que o campo fosse varrido. Era característica da geologia daquele campo a piçarra, o que para o time adversário tornara-se motivo para não aceitar o jogo lá. A comunidade desportista se mobilizou e o campo foi varrido pela manhã. À tarde, a conta veio, e saiu caro!
Se houve fatos marcantes pela importância histórica, há fatos que marcam pelo tom de piada. Se alguém perguntar se houve algum no campo do Mosqueirão? Houve vários, entretanto, um acabou por se tornar peça do fabulário de potocas do futebol. Conta-se que em um treino do Vasco, Zé Brasil, o querido Zé vaqueiro, estava na lateral direita do time da laranja, e tinha a difícil missão de marcar Vicente de Manezim, ponta esquerda ambidestro que tinha no seu repertório de dribles o famoso “rabo de vaca”. Ao arrancar para a linha de fundo, Vicente ameaça o cruzamento e Zé a “la Cafú”, dá o carrinho, Vicente puxa para a direita, Zé se levanta, e ante a ameaça de novo cruzamento, novo bote, Vicente puxa novamente para a esquerda, a poeira sobe, o filho de Manezim ameaça novamente o cruzamento de esquerda, desta vez o bote de Zé Brasil fora de pé mesmo, e seria definitivo, nova puxada, e nosso lateral aproveitando que a saída do campo era por ali mesmo na linha de fundo, fora embora e só voltou a campo dez anos depois como bandeirinha!
No início do novo milênio o campo foi extinto porque o terreno foi designado pela prefeitura para construção do ABC, pondo fim ao maior palco do futebol amador do bairro Alto da Penha. Outro terreno foi doado, um pouco mais afastado, onde foi construído o novo campo, mas ninguém esquece quando se fala de futebol daquele campo do Mosqueirão, lendário!
Por Francinaldo Dias. Professor, cronista, flamenguista, contador de “causos” e poeta
*Este texto é de inteira responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Revista Cariri